Thursday, November 29, 2007

Carmen, a Fêmea Alfa

Depois de uns cinco anos sem pisar no Theatro Municipal, 2007 foi um ano de muitos eventos culturais naquele local. Começou com o show da Madeleine Peyroux, depois teve o Bolshoi Brasil e, finalmente, o concerto da ópera Carmen.

De todas as óperas, talvez Carmen seja a mais pop. Mesmo quem não conhece nada de música erudita reconhece uma das árias da cigana. Já foram tantas as repetições em filmes e publicidades diversas que é difícil não cantarolar junto as melodias.

Eu, pessoalmente, acho Carmen fodíssima. Imagina uma mulher que, em pleno século XVIII, era livre, cobiçada e sensual. "As paixões de Carmen não duram mais que seis meses", avisa o toureiro ao mané D. José, que não se conforma com o pé na bunda que levou da protagonista, depois de ser expulso do exército e cair na clandestinidade - tudo por causa dela.

Carmen é o tipo de personagem que mantém discussões em mesas de bar, como se ela fosse uma pessoa de verdade. Quando o concerto terminou, um homem que estava ao meu lado lançou a observação que dá título a esse post: "Carmen é a fêmea alfa!" Achei incrível e anotei mentalmente, pra poder roubar e usar mais tarde (como estou fazendo agora). Esse mesmo homem disse que já viu mais de quinze versões cinematográficas da obra, com visões que vão desde Charles Chaplin a Goddard.

Saí do teatro com vontade de usar saia rodada e salto alto, mas logo tive que me conformar com a minha rotina jeans & tênis. Não adianta: quem nasce Billie Jean nunca será Carmenzita.

Wednesday, November 28, 2007

Sobre pessoas e livros em cinco minutos

Vou tentar disfarçar e dizer que quando entrei na sua casa não reparei que havia livros espalhados por todos os cantos: no banheiro, no quarto, na mesa de jantar e até na cozinha (e nem era um livro de culinária, o que me deixou muito intrigada. O que é que você lê na cozinha? Lê enquanto prepara o almoço?). Vou disfarçar e tentar convencer você de que não reparei que existia um livro aberto em cima do sofá, uma página marcada, que deve ter sido deixado de lado no exato momento em que toquei a campainha e interrompi a sua leitura. Mas como não consigo disfarçar porcaria nenhuma, como sou absolutamente transparente - e ainda não descobri se isso é bom ou ruim - acabei perguntando: "que livro é esse?". E você respondeu: "... blá blá blá Satre", e eu só entendi que tinha Sartre no título, mas que não era um livro do Sartre. E aí não falei mais nada, porque nunca tinha ouvido falar do tal livro, mas achei que devia ser interessante, porque a capa era legal. E eu julgo livros pela capa.

E tem mais: eu percebi que nenhum daqueles volumes estavam em português. Tinham uns em inglês, outros em francês e outros em espanhol, e eu secretamente fiquei orgulhosa. Não tem nada mais turn on pra mim do que inteligência.

E então você abriu a geladeira pra pegar alguma coisa pra gente beber e eu espiei lá dentro e vi que não era uma geladeira típica de casa de homem, com cerveja, água e ketchup e nada mais. Ao contrário, era uma geladeira muito mais preparada pra vida que a minha: tinha temperos e frutas e alguns ingredientes já cortados do que comporia o jantar de mais tarde que, na verdade, nunca aconteceu. E eu pedi a receita e você disse que não dava, depois disse que não tinha receita e que você cozinhava com o que tinha em casa, esquecendo que antes tinha me dito que havia saído pra comprar os ingredientes do prato, em uma contradição deliciosa em busca da valorização de qualidades.

Depois observei que as fotos do seu computador eram, na maioria, auto-retratos, e achei engraçada essa vaidade adolescente em meio a tantas qualidades maduras. Nada melhor do que acabar de conhecer uma pessoa e considerar engraçados os potenciais defeitos dela. Mas antes que eu desse continuidade à essa lógica, você me mostrou a sua coleção de mp3, e disse que pensava em redecorar o apartamento, e me convidou pra sentar e nem reclamou quando eu, espaçosa, tirei os sapatos.

Isso é que dá abrir as portas da sua casa pra uma virginiana.

Friday, November 23, 2007

Brincadeira do Copo

Eu sempre tive medo de histórias de fantasmas e almas e possessões. Fui ver a nova versão do Exorcista no cinema e quase morri do coração. Depois, foi a vez de amarelar ao assistir um trecho de "O exorcismo de Emily Rose" na TV: na hora em que o namorado acorda e encontra a Emily toda retorcida no chão, eu tive que mudar de canal. Era isso ou não conseguir dormir à noite.

Se agora que eu sou velha eu ainda tenho medo do sobrenatural, imagina quando era mais nova. Não tinha a mínima possibilidade de participar daquelas brincadeiras com copos e tesouras que todo mundo fazia - ou falava que fazia. E, pra falar a verdade, eu nunca soube se aquilo tudo que me contavam era real ou não. Devia ser uma grande mentira que eu, menina inocente, acreditava e morria de medo.

Tinha o caso do copo que saui voando do tabuleiro e bateu na parede, depois que um espírito brincalhão ficou irritado com as perguntas da roda. Os meus amigos me explicavam que espíritos brincalhões são os mais perigosos, e que sempre devemos perguntar primeiro se a entidade quer estava ali era séria ou não. Outra pergunta necessária era saber se a brincadeira poderia parar em determinado momento, já que os espíritos não gostavam dessa história de serem entrevistados e depois dispensados sem maiores explicações. Tudo deveria ser feito com grande respeito.

Uma vez, eu e minhas amigas estávamos na casa de uma delas, em Miguel Pereira, e resolvemos conversar com um espírito através do pêndulo. O lance era parecido com a brincadeira do copo: a gente fazia uma roda e falava: "espírito, mostre o seu sim", e aí o pêndulo balançava pra um lado. Depois, só pra confirmar, a gente falava: "espírito, mostre seu não", e o pêndulo deveria balançar para o lado oposto. Enfim, nesse dia a gente perguntou se aquela era uma alma brincalhona e o pêndulo disse que sim, e imediatamente todas as meninas ficaram morrendo de medo. Pedimos então para parar com a brincadeira e tivemos a nossa vontade concedida, para alívio geral.
Pelo visto o espírito brincalhão tava sem o mínimo saco de brincar com a gente.

Thursday, November 22, 2007

Top 5 dos Melhores e Piores de 2007

(sob a minha visão altamente influenciável)

Melhores Shows:
1 - LCDSoundsystem no Circo
2 - Bjork no Tim Festival
3 - Nouvelle Vague no Circo
4 - Devo no Planeta Terra
5 - Los Hermanos na Fundição Progresso

Planos não realizados:
1 - Parar de fumar
2 - Entrar para uma academia
3 - Guardar dinheiro
4 - Mobiliar o apartamento novo
5 - Aproveitar mais o dia

Programa de fim de semana (dia):
1 - Paineiras
2 - Segundo Coqueirão de Ipanema (estacionando no Leblon e andando pelo calçadão até o posto 9)
3 - Café da manhã à uma da tarde no Leblon
4 - Almoço às cinco da tarde em Santa Teresa
5 - Cerveja na muretinha do Bar Urca

Programa de fim de semana (noite):
1 - Fix
2 - Cerveja na muretinha da São Salvador
3 - Festa de música black
4 - Aniversários de amigos e amigos dos amigos
5 - Festa na casa do Marinho

Viagens incríveis (trabalho e/ou lazer):
1 - Paris
2 - Fernando de Noronha
3 - Despedida de Vera Cruz
4 - Búzios com chuva
5 - Fim de semana gastação em sp

Wednesday, November 14, 2007

Falling in love for an android with delayed reaction

Eu me apaixonei por um robô com reações retardadas. Aliás, eu venho me apaixonando por tipos assim nos últimos cinco anos, o que me faz pensar sobre os padrões que a gente escolhe nessa vida. Eles não sabem que são robôs com defeito, e eu não sei que são do mesmo jeito de sempre quando me apaixono por eles. Só depois de um tempo é que a falha vem à tona - como todos os outros defeitos de fabricação - e aí já é tarde demais para se escapar das garras do amor. No fim das contas, amar é só a capacidade de aturar, com mais paciência do que o usual, os defeitos alheios.

Porque ele era um andróide incrivelmente lindo, com grandes e tímidos olhos azuis e um sotaque característico de sua condição de máquina, à princípio o delay das reações era só mais um de seus charmes. Eu mandava emails apaixonados que nunca recebiam respostas. Eu ligava e não era atendida e, nas raras ocasiões em que recebia uma resposta imediata no aparelhinho de celular, eram sempre evasivas e esquivas. Mas a única saída para quem se apaixona por um robô com reações retardadas é esperar que seus circuitos finalmente se consertem. Sozinhos.

Eu criava ferramentas imaginárias para tentar consertar meu irresistível cyborg de olhos azuis. Explicava a mesma coisa repetidas vezes pra ver se ele entendia bem. Mas, coitado, devido à sua condição de mal fabricado, de nada adiantavam as minhas soluções inventadas. Em questão de tempo - muito tempo - o charme do andróide perdeu a graça e as minhas ferramentas se amontoaram inúteis em um canto da garagem.

Agora ele entende tudo. Mas agora não dá mais tempo.
É esse o resultado de se apaixonar por andróides com reações retardadas.

Tuesday, November 13, 2007

Android with delayed reaction

Às vezes tenho uns ímpetos incontroláveis de dizer a verdade, mesmo que o outro lado não queira ouvir. E digo sem ser convidada, mesmo que a verdade seja apenas temporária - minhas verdades são mutáveis, assim como as minhas paixões: leviandade, teu nome é mulher.

E quando ouvem verdades, os que não querem ouvir se fazem de surdos, de desentendidos e de burros. Eu mesma já apliquei tantas vezes essa tática, meu bem. A grande diferença está na parte do saber: eu sei que quando eles não ouvem é mentira, enquanto que eu, quando não me faço ouvir, estou plenamente consciente de que aquilo é uma farsa. Deu pra sacar?

São todos uns robôs com mecanismo retardado. Todos eles programados para não responderem na hora, sofrendo um tremendo de um timing errado, entendendo a regra quando o jogo já acabou. Cyborgs com defeito, todos eles.

A grande merda é que eu sou obrigada a conviver com isso.

Sunday, November 04, 2007

Taxi Driver

- Boa noite. Lapa, por favor.

Pega o celular e disca pra qualquer número, porque não suporta silêncio de táxi, nem conversa com o taxista. Se bem que tem uns que são legais. Vontade de fumar um cigarro, vontade de comer uma bala, e o primeiro número não atende. Olha pela janela todas as luzes e todas as faunas e o taxista avisa:

- Não vai esquecer o celular em cima do banco, hein, boneca.

Diz que não, pode deixar, já tá na bolsa - mas, na verdade, estava ligando pra outro número e pensando: "só tenho uma nota de cinquenta, será que esse cara tem troco?"
Toca o alerta da mensagem dizendo que já chegaram, o cigarro está ali, luminoso, falta só mais um sinal e depois um pouquinho de engarrafamento, pela janela vai vendo televisão, quase chegando, o celular já tá guardado, o dinheiro tá na mão.

- Boa noite, bom divertimento pra você, princesa.

- Boa noite pro senhor.

E fecha a porta.

Paineiras

Enquanto sinto o ar mais fresco nas minhas bochechas, vou suando morro acima. No caminho, um muro de pedra para fazer rapel, o Cristo bem pertinho, bicicleta e skate, vai mais devagar que você anda muito rápido, assim as minhas coxas ficam doídas o resto da semana, aqui tem uma vista boa da Lagoa, repara só como essa árvore caiu mas ainda está viva (vai viver assim ainda por muitos e muitos anos), fila pra entrar embaixo do cano, água gelada que aperta o peito e tira o fôlego, não quis sair ontem porque queria ouvir Nouvelle Vague aqui em cima, as mulheres contam para as amigas sua vida sexual com detalhes, tá falando sério?, suas bochechas são musculosas, deve ser porque eu vivo rindo que nem boba, vocês vão subir pro Cristo?, vocês querem uma van?, do you want a car?, vontade de comer arroz com brócolis e lula, eu prefiro mesa de ferro e cerveja de garrafa e piadas masculinas a mesa de restaurante japonês cheio de mulheres, tá falando sério?, se quiser eu dirijo pra você curtir a vista, você tem cara de alemã, tenho?, por que você não me chamou antes?, não conheço mais ninguém que goste de passear aqui, meus amigos só saem à noite, to virando eremita - mas pelo menos o iPod tá sempre comigo, já viu que louco esse bicho aqui?, tomara que ele não venha pousar em mim, acho que to virando hippie, mas hoje à noite tem festa de eletrônico, né? Tem... Sempre tem.

Céu de Santa Teresa


Quase mar.