Thursday, November 17, 2005

Viagem parte V - Alto do Moura, Caruaru, PE

Alto do Moura é a referência de artesanato do nordeste. Tudo aquilo que a gente vê vendendo em feiras - bonecos de barro, bois sem perna, estátuas de Lampião e Maria Bonita - tudo isso é produzido lá e exportado para os outros cantos do país. Hoje, Alto do Moura é um amontoado de ateliês e lojinhas por onde turistas nacionais e internacionais se acabam nas compras. É que lá é barato demais, próprio para comprar presentes para toda a família.

Todo mundo que mora em Alto do Moura faz esculturas. Esse conhecimento é passado de geração em geração, e as crianças do lugar aprendem a fazer brinquedos de barro ao invés de comprar bonecos e panelinhas de plástico nas lojas. Até Mestre Vitalino, que foi quem elevou os bonequinhos de barro à categoria de arte popular, aprendeu seu ofício fazendo brinquedos.

Um lado ruim (já que falaram que eu to muito deslumbrada com o nordeste heheh): eu, como turista otário que sou, acabei pagando muito mais caro pelas peças. Explico: eu não sei pechinchar, e no Alto do Moura é essencial chorar um pouquinho na hora do pagamento. Dessa forma, é possível conseguir um desconto muito interessante - pelo menos foi o que presenciei com os chorões do meu grupo. Vai ver que é por isso que o carioca é conhecido no nordeste como ruim de jogo.

Tuesday, November 15, 2005

Viagem parte IV - Areia, PB e Barra de Cunhaú, RN

Viajar pelo interior do país é muito diferente de viajar pelas cidades turísticas. Não só por causa das diferenças socias e etc, mas pelas paisagens que só uma corrida de carro proporciona. Foi conhecendo as estradas da Paraíba e Rio Grande do Norte que descobri que o céu do nordeste brasileiro talvez seja o mais bonito do mundo. Muito azul, com nuvens brancas aqui e ali, interminável e limpo. Quase uma poesia.

Areia foi a primeira cidade da Paraíba a ser tombada pelo Patrimônio Histórico Nacional. É também o lugar onde foi construído o primeiro teatro do estado, no começo do século XX. Por ser uma cidade no alto da serra, o clima de lá é ameno, e à noitinha faz certo frio, inesperado em um município do nordeste - pelo menos para aqueles que moram lá pro sul, como eu.

O caso de Barra do Cunhaú é outro. Trata-se de uma localidade no litoral do Rio Grande do Norte, uma colônia de pescadores que recentemente foi descoberta pelos gringos que gostam de praticar kite e windsurf. A fama da cidade cresceu de tal forma que vários restaurantes e pousadas foram abertos da noite para o dia. O engraçado é que pouca gente noBrasil conhece Cunhaú, e outro dia eu peguei um vôo com uma menina que é campeã brasileira de alguma categoria de kite surf e ela confessou nunca ter pisado no lugar. Nem ouvido falar.

Agora, imagine o que é para os habitantes das duas cidades, pessoas que têm um ritmo de vida muito diferente dos que vivem nas metrópoles, receber uma equipe de reportagem de televisão. É quase como uma invasão, um estupro no cotidiano deles, com todos aqueles equipamentos, cases, vans e etc. Aliás, tenho pensado muito sobre tempo e estilo de vida, mas ainda não cheguei a nenhuma conclusão do que quero pro meu futuro. Pra variar, a única coisa que pode parecer segura, na minha vida, é saber o que não quero. E até isso muda com mais freqüência do que eu gostaria.

Saturday, November 12, 2005

Viagem parte III - Recife

Eu ando tipo apaixonada por Recife. Completamente in love. A cidade tem um clima de Rio de Janeiro mas, ao mesmo tempo, esconde nas entranhas anos e anos de história. E a gente sente isso quando anda pelos becos e quando visita o centro antigo das igrejas caindo aos pedaços e ruas cheirando a esgoto.

Recife se autointitula "Veneza brasileira", porque é cortada por dois rios, etc e tal. Nunca fui a Veneza, mas imagino que deve haver uma grande licença poética na comparação. O que eu posso afirmar é que a capital de Pernambuco é de verdade o lugar dos homens caranguejos, como dizia Chico Science, porque o mangue faz parte da cidade tanto quanto as igrejas centenárias.

Eu me apaixonei por Recife porque tudo aqui é absolutamente mergulhado em cultura, popular ou erudita, para pobres e ricos. Veja bem: hoje é sábado e na cidade se apresenta a ópera Carmem, o grupo Cordel do Fogo Encantado e o Pastoril do Velho Maroto, para citar apenas esses poucos. Milhões de micro acontecimentos pipocam ao mesmo tempo, em cantos por onde já passaram índios, negros, portugueses e holandeses, de forma que o povo daqui tem uma aparência muito característica.

E como os pernambucanos gostam de assuntar. Quem é do tipo que prefere ficar sozinho olhando o mar e fumando um cigarrinho não deve se assustar. Porque aqui, se você está de bobeira, vem logo um puxar assunto. E o assunto não termina nunca mais. E vira um caso depois do outro, e quase todo mundo já morou no Rio (ok, agora é a minha vez da licença poética...), e a conversa rola pra sempre, a menos que um dos interlocutores tenha que trabalhar. E essa parte, invariavelmente, é minha.

Ah, sim, e tem os tubarões. Ao longo do calçadão da praia de Boa Viagem - tipo Ipanema, sabe? - ficam expostas placas com o desenho de um tubarão e os dizeres: Cuidado. Área sujeita a ataques. Proibido surfar.
E eu, como boa turista, fui fotografada com uma dessas placas fazendo fundo, por uma senhora que tomava sol no banco do calçadão. E que puxou papo comigo.

Rapidinhas porque estou com sono

*** É só a Bárbara colocar um link pra cá no blog dela que começa a entrar um monte de gente nova. Celebridade internética é isso aí.

*** Uma das minhas maiores divesrões ultimamente é descobrir como as pessoas acham este blog. As pesquisas no Google são as mais loucas, e eu sempre fico imaginando que o cara que tava procurando determinada coisa na net e acabou caindo aqui deve ter ficado deveras decepcionado. Afinal de contas, aqui não existe informação confiável.

*** Tá passando Ghost World no Telecine Cult. Cool!

Monday, November 07, 2005

Êxtase natural é melhor do que em pílulas

Se tem uma coisa que me deixa em êxtase, é arte. Pode parecer pedante, mas é verdade: às vezes estou lendo um livro e passo por algum trecho que me dá vontade de ligar pra amigos e conversar sobre o que li por horas e horas, até esgotar o assunto. Ou então quando vejo um quadro e tenho vontade de abraçar alguém ao meu lado, ou puxar um estranho pelo braço e falar:"você viu isso? como é que isso é possível?", e ficar rindo que nem boba, meio saltitante, entende? Não se trata de um carão cultural, mas é que existem situações em que eu sou tocada muito fundo na alma.

Hoje foi um desses dias em que eu me senti como criança em parque de diversões. Fui visitar o museu do Francisco Brennand em Recife, que é um dos lugares mais maravilhosos que eu já vi na vida.

Brennand é um senhor de família rica, que herdou do pai (dentre outras coisas, é claro) uma fábrica de cerâmicas abandonada. Ele reconstruiu a fábrica, transformou em museu e exposição de peças, abriu uma oficina de cerâmica e recebe, diariamente, dezenas de pessoas do mundo inteiro que vêm admirar suas obras. Ele é um velho safado, já nos seus 78 anos, que enche os jardins e o interior da antiga fábrica de seu pai com esculturas fálicas, peitos, cabeças e desenhos completamente insanos. Ele é tão controverso que uma parte da população de Recife ficou revoltada com a escultura que ele colocou próxima ao Marco Zero - encomendado pelo governador - e que se trata de um obelisco de muitos metros de altura que lembra bastante um pênis.
É um velho safado, mas eu adoro.

Enquanto estava lá, extasiada, passeando pela releitura do Taj Mahal que Brennand contruiu, me deparo com o próprio artista conversando com um grupo de visitantes. Ele trabalha no museu, de segunda a sexta, e recebe pessoalmente os turistas que vão prestigiá-lo. Fiquei com uma vontade louca de ir até ele e apertar sua mão, e falar alguma coisa do tipo: "isso aqui é sensacional"; mas aí deu vergonha. Vergonha! Logo eu, tão cara de pau pra algumas coisas, fiquei toda travada e acabei desistindo da idéia de conversar com o homem. Quem sabe outro dia...

Mas outro dia talvez não exista, como ele mesmo já sacou. Aos 78 anos, a gente começa a pensar que daqui a pouco a morte chega. Brennand sacou a proximidade da morte, mas não se deixou intimidar: está construindo um grande mausoléu em uma parte do jardim onde se lê "Casa dos Sacrfifícios"(ou algo parecido, não lembro muito bem...). Fúnebre? Nem um pouco. A construção está pintada de vermelho, cheia de esculturas - fálicas ou não - e envolta naquele clima mágico que ele conseguiu criar em todo o espaço.
Aquilo lá parece o País das Maravilhas. E eu confesso que me senti meio Alice.

Friday, November 04, 2005

Viagem parte II - São Luís

Pra quem acha que o Rio é quente, São Luís deve ser tipo a casa de verão do diabo. Fica logo ali, na esquina da linha do Equador, e o sol faz juz à localização. É de rachar qualquer coco. Eu saí todos os dias usando filtro solar 15, boné e óculos escuros e, mesmo assim, quando me olho no espelho fico assustada com meu bronzeado. Há muito tempo eu não tinha uma cor assim tão... saudável. To adorando.

Mas a cidade é demais de maravilhosa para quem está de férias. O surpreendente é que neste polo turístico internacional que é São Luís do Maranhão só existe um hotel cinco estrelas. Perguntei pro Pituíba, nosso motorista-chaveirinho que calça 33, por que grandes redes de hotéis não vieram encher as burras de dinheiro na cidade. Ele me explicou que tudo o que existe de investimento no estado, e principalmente em São Luís, tem que passar pelo crivo do Sarney. Por "crivo" quero dizer que o Sarney tem que ter uma porcentagem, tem que ser sócio, tem que estar participando. Se não, nada feito.

O povo daqui é totalmente mixed feelings em relação a José Sarney: eles são gratos pelos avanços que o político trouxe, e ao mesmo tempo têm raiva porque ele bloqueia novos investimentos. Existe até a piada de que o livro que o Sarney escreveu entitulado "O dono do Mar" na verdade deveria se chamar "O Dono do Maranhão".

Fora esse pequeno detalhe do nosso ex-presidente, o povo de São Luís é incrível. Hospitaleiros, animadíssimos, participantes ativos de festas populares que pipocam o ano inteiro. Digo que é um povo incrível porque eles continuam comemorando e dançando e cantando no meio da grande pobreza que arrasa o estado. Mais uma vez, para quem acha que no Rio de Janeiro existe gente pobre, precisa conhecer Maranhão. É triste demais, e nós, classe média pseudo-européia do sudeste, não estamos preparados para ver meninos de 6 anos com dentes podres. Pra se ter uma idéia.

De São Luís, carrego ombros ardendo e vermelhos, bronzeado a la taxista (daqueles que tem a marca da manga da blusa, saca?), arroz de cuxá, um milhão de maneiras de preparar e comer camarão, Dona Lili - que aos 77 anos é considerada patrimônio cultural da cidade -, centro histórico, guias mirim, passagens subterrâneas que ligavam igrejas e pequenos bumba-meu-boi para dar de presente. Ah, que terra boa...

Thursday, November 03, 2005

Só no Maranhão você encontra Jesus

Em São Luís, Coca-Cola e Guaraná Antártica não são sucesso. O campeão de vendas na categoria é o Guaraná Jesus, um refrigerante tão rosa, mas tão rosa, que se eu ainda tivesse 16 anos iria tentar pintar o meu cabelo dessa cor. É que aos 16 eu gostava muito de cores não convencionais para cabelos. Anyway, Jesus tem gosto de groselha, canela e água com gás, e exibe, em letras garrafais, o aviso: "Colorido artificialmente". Ah, bom...

Outro dia um guia mirim me contou que a Coca-Cola comprou a produção do refrigerante, e que ele só não é comercializado no resto do Brasil porque o antigo dono, em seu leito de morte, pediu que a distribuição ficasse só no Maranhão. E acabou que a bebida se tornou tão folclórica e popular quanto o bumba-meu-boi e o reggae, e até na loja de artesanato do hotel vendem garrafinhas da marca, altamente inflacionadas: R$1,50 cada.

Eu já sabia que Jesus existia porque um dia entrei em um apartamento que exibia a garrafa de vidro, ainda fechada, como enfeite. Só que a cor já estava desbotada, e o sabor incomparável não podia ser apreciado. Agora, saio de São Luís a caminho do Recife com três garrafas na mala. Uma pra mim, outra pro dono do apartamento onde jazia o refrigerante desbotado, e a terceira para os meus amigos provarem.
Porque todo mundo deveria provar Jesus uma vez na vida.

Wednesday, November 02, 2005

Viagem parte I - Fortaleza

A semana passada foi toda cearense. E, cara, como eu gosto do Ceará. Vai ver é porque uma vez tive umas férias maravilhosas em Jericoacoara, e em uma noite na boate moderninha de Fortaleza, o Órbita, eu fiz dezenas de amigos e levei todo mundo pro hotel onde eu estava hospedada, e a galera ficou em festa até que o recepcionista ligou pro meu quarto e disse que se aquele povo todo continuasse lá até depois das 6h, ele teria que cobrar uma diária de cada. Em questão de segundos coloquei todo mundo pra fora, com troca de endereços e emails e a promessa de manter contato. Óbvio que nunca mais falei com nenhum daqueles novos amigos.

Esse era um tempo bom, quando eu era jovem e podia fazer viagens deste tipo. Agora, passei por Fortaleza a trabalho mesmo. E cheguei do vôo e deixei minhas coisas no hotel e saí correndo pra gravar, como costuma ser no meu trabalho. Estômago enrolando de nervoso de não dar tempo de gravar tudo, filtro solar 15, óculos, boné e, mesmo assim, ombro vermelho à noite. E olha que eu adoro tudo isso.

Se bem que eu provei o mar do Ceará no meu segundo dia. Fomos gravar em uma cidadezinha chamada Paracuru, a 1h30 de Fortaleza, que é conhecida entre gente saudável como um windsurf spot. Depois que terminamos tudo, lá para as 5h30, corremos para a praia aproveitando os últimos resquícios de sol. 5h30 aqui já está quase escuro mas, em ,compensação, o dia amanhece bem cedo, tipo 5h da manhã. Ah, sim, e não tem horário de verão. Mas então, lá na praia, terminamos o dia mergulhados naquele mar delicioso, com tudo escuro ao nosso redor, minha bolsa jogada na areia e eu sem nenhum medo de que ela sumisse. Aquilo era Paracuru, pelo amor de deus, e só a empresa onde eu trabalho deve ter mais empregados do que aquela cidade tem de habitantes. E eu acho que todo mundo deveria dar uma passadinha lá pra ver como aquilo funciona.

Mas não é só isso, tem o povo também. Um povo sofrido pra caramba, que faz qualquer pessoa com crises existenciais se achar o ser humano mais ridículo da Terra. O nordeste - principalmente o Ceará - pode ser visto de duas maneiras: daquela em que você curte as praias, volta bronzeado e passa longe da realidade, ou aquela em que você perde o sono tentando imaginar como é que as pessoas daqui fazem pra manter o humor em certas situações. Eu, pra variar, to tentando o caminho do meio.